Na altura em que venceu o Oscar de Melhor Direção com o filme Guerra ao Terror, Kathryn Bigelow foi a primeira mulher a levantar a estatueta na história da categoria.
Felizmente, desde a data, mais duas diretoras também venceram o prêmio, Chloé Zhao e Jane Campion. O que, convenhamos, ainda é pouco, tendo em vista a variedade de cineastas contemporâneas extraordinárias, como Andrea Arnold, Greta Gerwig, Kelly Reichardt, Lynne Ramsay, Alice Rohrwacher, Lucrecia Martel e por aí vai... E podería enumerar muitas outras!
Aproveitando o lançamento do novo filme de Kathryn Bigelow, Casa de Dinamite, que estreou no Festival de Veneza e já está disponível na Netflix, por que não um passeio por toda a filmografia da diretora norte-americana, que é conhecida primordialmente pelos seus suspenses políticos? Neste guia da JustWatch, conheça todos os filmes (longas-metragens) já realizados por Kathryn, através de um ranking que vai do pior até o melhor de todos eles.
11. O Peso da Água (2000)
Quando se trata de uma diretora deste porte, fica difícil chamar o último filme da lista de ‘o pior’, uma vez que também é uma obra com inúmeras virtudes. No entanto, O Peso da Água é um longa que não tem a mesma precisão narrativa dos demais filmes da sua carreira. E isso, muito por conta da sua experimentalidade, que alterna entre duas linhas do tempo distintas de maneira forçada.
Ao resolver traçar paralelos entre a vida de uma fotógrafa que viaja por um arquipélago, e a história de um duplo homicídio que ocorreu neste mesmo local mais de cem anos antes, o longa toma uma atitude narrativa e visual bastante corajosa, mas por vezes confusa. É claro que filmes como Fonte da Vida já fizeram o mesmo de uma maneira mais coerente, mas O Peso da Água peca justamente por forçar comparações entre duas histórias e personagens que não mostram tanta similaridade. Mesmo assim, não deixa de ser um filme com fortes performances (incluindo o sedutor e jovem Sean Penn), que recomendo aos que procuram um suspense com uma forte tensão sexual.
10. The Loveless (1981)
A estreia na direção de Kathryn Bigelow aconteceu através de uma parceria com Monty Montgomery, onde realizaram juntos The Loveless, uma obra independente sobre uma gangue de motoqueiros que aterroriza uma cidade nos sul dos Estados Unidos. Um longa imperdível para você que gostou de Clube dos Vândalos, um filme de época que também centra sua história em um grupo de motociclistas.
À semelhança de O Peso da Água, dá para notar uma liberdade artística muito grande nas escolhas da diretora, com a diferença de que em The Loveless, tais escolhas não soam de maneira forçada, mas sim natural. Um filme de atmosfera, que consegue provocar uma sensação nostálgica no espectador, através do seu ambiente e ritmo que simulam uma época a qual a diretora com certeza guarda com bastante carinho. Certamente, um longa que já manifestava um dos aspectos mais notáveis do seu estilo de cinema: a capacidade de imersão da obra no mundo dos seus personagens, seja pela atuação realista ou pela fotografia mais íntima.
9. Jogo Perverso (1990)
Mas onde estão os suspenses e os thrillers de Kathryn Bigelow? Calma, que já chegamos ao primeiro deles. Jogo Perverso é um típico filme de stalker, como Perversa Paixão, que acompanha uma policial afastada do serviço que passa a ser perseguida por um psicopata obsessivo. Ao trazer uma protagonista mulher (Jamie Lee Curtis) em um ambiente dominado por homens, a diretora também acaba explorando o sexismo que existe na profissão.
Comparado com The Loveless, é um filme muito mais estilizado e autoconsciente, que começa a definir ainda mais a identidade de Kathryn Bigelow como diretora. Aqui, seus planos-sequência mais longos e o ponto de vista subjetivo (que provoca no espectador uma sensação de imersão ainda maior) já aparecem de maneira gradual. Um longa que indico bastante aos fãs da diretora que estão à procura dos seus filmes de gênero mais antigos.
8. K-19: The Widowmaker (2002)
Na oitava posição, aparece o primeiro suspense político realizado na sua carreira, intitulado K-19: The Widowmaker. Um filme que lembra o ambiente tenso e claustrofóbico de Casa de Dinamite, mas ao invés de seguir centros de comando governamentais nos Estados Unidos, acompanha uma tripulação russa em um submarino nuclear, que apresenta graves falhas durante a missão.
Por ser baseado em uma história real (assim como seus principais filmes), Kathryn Bigelow mergulha nos detalhes visuais do ambiente angustiante do submarino, mas também nas nuances emocionais dos personagens que ocupam aquele espaço — potencializadas por atuações grandiosas de Liam Neeson e Harrison Ford. Uma obra extremamente apelativa aos que gostam de tragédias de navegações como Kursk - A Última Missão, e que merece ocupar a oitava posição por ser um filme ainda mais maduro e sofisticado que Jogo Perverso.
7. Caçadores de Emoção (1991)
Um filme de ação de Kathryn Bigelow nunca é apenas um filme de ação. Por trás das cenas extremamente bem coreografadas e da energia pulsante e angustiante das suas obras mais intensas, sempre submergem temas e percepções críticas bastante aguçadas. Exemplo disso, é o filme Caçadores de Emoção, que utiliza o gênero de maneira original e bastante subversiva.
Isso porque a diretora reflete sobre diferentes estereótipos da masculinidade através de uma história de assalto a banco, relacionada com um grupo de surfistas. No entanto, é um filme que funciona também apenas como entretenimento, uma vez que suas sequências de ação (principalmente de perseguição, brigas e lutas) são ainda mais impressionantes do que K-19: The Widowmaker — que, por sinal, teve um orçamento muito maior. Caçadores de Emoção é um grande exemplo da maestria cinematográfica da diretora, que consegue transformar um filme teoricamente ‘comum’ em uma obra extraordinária.
6. Estranhos Prazeres (1995)
Para quem gosta de filmes de ficção científica, como Matrix, Estranhos Prazeres é um longa simplesmente imperdível. Me impressiona como normalmente não é citado entre os melhores filmes do gênero, uma vez que faz um retrato distópico sombrio e altamente imersivo sobre a realidade virtual, através de uma história de um ex-policial que comercializa memórias de outras pessoas gravadas em CDs — onde uma dessas mídias acaba expondo um assassinato que revela uma rede de conspirações.
Se você ficou impressionado com o que Kathryn Bigelow é capaz de fazer (estilísticamente) com Caçadores de Emoção, espere até assistir a Estranhos Prazeres. Com sua câmera vibrante e íntima e seus planos subjetivos grandiosos, nossa sensação é de estar literalmente dentro do filme. Um thriller com uma ambientação de tirar o fôlego, situada no efervescer da virada do ano 1999 para 2000 — época marcada por inúmeras teorias conspiratórias e distópicas.
5. Quando Chega a Escuridão (1987)
O mesmo ambiente escuro e sombrio de Estranhos Prazeres é encontrado em Quando Chega a Escuridão, com a diferença de que este trata-se de um filme de vampiros no interior dos Estados Unidos. Além disso, por ter sido realizado com uma ‘mise-en-scène’ muito mais realista, o estilo de Kathryn Bigelow se manifesta de forma mais natural. Por isso, a quinta posição do ranking.
É um longa que me lembra um pouco o clima de Até Os Ossos, já que também traz criaturas sobrenaturais nômades que vagueiam pelas estradas da América do Norte em busca das suas vítimas. Sem contar o fato de que mistura romance com terror de uma forma muito semelhante. Na minha visão, é um dos filmes de vampiro mais viscerais do cinema, uma vez que explora a selvageria dessas criaturas de maneira profunda e, ao mesmo tempo, bastante humana.
4. Casa de Dinamite (2025)
Chegamos ao último lançamento de Kathryn Bigelow, um filme que te deixará apreensivo do começo ao fim. Casa de Dinamite parte de uma premissa fictícia muito interessante, para discutir temas políticos contemporâneos de extrema relevância. Imagine se um míssil nuclear desconhecido fosse lançado em direção aos Estados Unidos, como o país reagiria ao ataque? Este é o ponto de partida do longa, que constrói toda a sua tensão em volta da reação do governo americano frente ao objeto que está prestes a cair em seu território.
Filmado de maneira quase documental, Kathryn nos entrega um dos seus filmes mais inquietantes e angustiantes da carreira, que nos coloca dentro dos centros de comando governamentais dos Estados Unidos, nos revelando os bastidores desses espaços secretos. Um filme construído de maneira episódica e com diferentes pontos de vista (assim como o longa A Hora do Mal), que eleva o suspense a outro nível. Casa de Dinamite é uma obra que certamente te deixará impactado após sua exibição.
3. Detroit em Rebelião (2017)
Em 1967, a cidade de Detroit, nos Estados Unidos, viveu um dos seus momentos mais delicados, com uma revolta popular provocada após um ataque policial que deixou algumas vítimas. Assim como em Casa de Dinamite, Detroit em Rebelião também é um filme político, mas com um viés mais assertivo e um caráter de denúncia, em relação à crueldade policial contra a comunidade negra dos Estados Unidos.
Na minha visão, um dos grandes méritos do filme, é justamente utilizar o cinema de gênero como um veículo para a questão racial do país. Aqui, toda a tensão é construída para causar um incômodo no espectador, com o intuito de nos fazer refletir sobre a violência e a desigualdade presentes na sociedade americana. Algo muito semelhante ao que faz o clássico Mississippi em Chamas. Assim, Detroit em Rebelião, por ser quase uma espécie de documento histórico, merece a terceira posição da lista.
2. A Hora Mais Escura (2012)
Nas duas primeiras colocações, evidentemente se situam os dois clássicos modernos de Kathryn Bigelow. Começando por A Hora Mais Escura, o filme que retrata meticulosamente a caçada norte-americana para encontrar o líder terrorista, Osama Bin Laden. Da sua filmografia, com exceção de Guerra ao Terror é, sem dúvida, a sua obra mais imersiva e angustiante, que utiliza os mais sofisticados artifícios visuais para recriar todos os detalhes desta mega-operação.
Aos que se impressionaram com as sequências realistas de Tropa de Elite, espere até assistir A Hora Mais Escura — que contém cenas quase documentais, filmadas de uma maneira que te coloca dentro das operações militares. Um filme que, mesmo abordando diversas questões éticas e morais, consegue causar no espectador a sensação de que está assistindo uma obra tecnicamente perfeita. Tanto é que obteve cinco indicações ao Oscar no ano em que foi lançado.
1. Guerra ao Terror (2008)
E finalmente, chegamos à obra definidora da carreira de Kathryn Bigelow como diretora. Guerra ao Terror combina as maiores virtudes do estilo da cineasta — câmera imersiva, exploração do tema da violência e masculinidade, narrativa realista e personagens extremos — em apenas um filme. Comparado com A Hora Mais Escura, é um longa ainda mais sensorial, cuja estética e narrativa nos faz sentir na pele (e na mente) dos soldados americanos durante a Guerra do Iraque.
Através da história, fazemos um mergulho no estado psicológico e nos conflitos de um esquadrão anti-bomba — não preciso nem comentar o quão tensas e ameaçadoras são as cenas em que os personagens tentam desarmar os explosivos. Se você gosta de obras de suspense e ação com temas similares, como Sniper Americano e 1917, saiba que ambos, a meu ver, levando em conta aspectos técnicos, mas também narrativos, não chegam aos pés de Guerra ao Terror — um verdadeiro clássico do cinema moderno, que redefiniu o gênero de filmes de guerra.




























































































